Autor(es): Por João Bernardo Caldeira | Do Rio |
Valor Econômico - 02/09/2011 |
Foram apenas oito meses à frente do Ministério da Cultura (MinC), porém tempo suficiente para que a ministra Ana de Hollanda enfrentasse mais críticas e polêmicas do que muitos em quatro anos de gestão. Apesar das turbulências e duras acusações, como o envolvimento com o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) de direitos autorais, a cantora e ministra preferiu manter a reserva, sempre distante dos holofotes. O comportamento discreto provocou incertezas sobre a posição da pasta a respeito de temas em voga, como as reformas da Lei Rouanet e do direito autoral. Também ainda não está claro, para o mundo da cultura, quais seriam as propostas e o estilo de governo da ministra, que tem a missão de imprimir sua marca sem revogar as das administrações também petistas de Gilberto Gil e Juca Ferreira, últimos ocupantes do posto. Neste semestre, no entanto, o ministério finalmente começará a mostrar identidade própria. Como um dos carros-chefes de sua gestão, Ana elege a economia criativa, que ganhou status de secretaria, como área prioritária. Em breve, a ministra espera anunciar também iniciativas alinhavadas com o Ministério da Educação, que estreitarão a cooperação entre as duas pastas. E, para pôr um ponto final na polêmica reforma da legislação autoral, Ana revela que o novo texto, concluído pelo MinC, será em breve divulgado prevendo uma novidade: a criação do Registro Nacional de Obras, um banco de dados público com as informações referentes a todos os produtos culturais lançados no país. Embora faça questão de destacar a preferência pela discrição, a ministra não se exime de reconhecer a insuficiência de recursos ou de distinguir-se de seu antecessor, afirmando que não buscará os aplausos lançando projetos "de mídia". "Minha atuação será de menos show e mais ação", sublinha. Mesmo que garanta a disposição em trabalhar dentro de seu apertado limite financeiro, Ana mostra-se ciente da situação de emergência existente: "Grande parte do orçamento do Iphan [Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional] é utilizada para escorar parede para prédio não cair". E alerta: "Fala-se muito da infraestrutura de aeroportos e estradas para a Copa do Mundo no Brasil, mas temos de pensar também em nossos museus e cidades históricas". Leia, a seguir, trechos da entrevista que a ministra concedeu ao Valor. Valor: Desde que assumiu a pasta, foram raras as entrevistas, diversas as críticas e uma atuação discreta, sem agenda propositiva aparente. Qual é, afinal, a marca que distinguirá a administração Ana de Hollanda das anteriores? Ampliar imagem Ana de Hollanda: Quero atuar de forma mais discreta; meu estilo é diferente do estilo dos ministros Juca e Gil. Quero focar a gestão. Todo primeiro ano é um pouco de organização da casa. E todas essas críticas e crises foram externas, portanto não retratam o que está acontecendo internamente. O apoio do mundo da cultura foi praticamente total. Realmente, todo o processo é muito lento, as nomeações demoraram muito. A questão que estamos enfocando com grande ênfase é a da economia criativa. Queremos organizar esse sistema, que em geral se desenvolveu de forma desordenada e com forte dependência do Estado e das leis de incentivo. Não existe sustentabilidade como havia, por exemplo, no teatro, no passado, quando se mantinham sessões lotadas de domingo a domingo. A indústria criativa passa pelo criador, pela produção e pelo fomento, até chegar à distribuição e ao consumo. É um trabalho de pesquisa, de interligação com os outros ministérios e de rede. Não aparece, mas vai gerar resultados imediatos. Estamos também verificando processos internos - orçamento e convênios que não tinham sido pagos ou estavam sem documentos. Nas finanças, houve um corte muito grande, e temos de trabalhar com as limitações deste primeiro ano. Queremos responder a questões como: que ministério queremos para os próximos quatro anos? Qual é o nosso potencial? E do que o mundo da cultura e o cidadão estão sentindo falta? Esse tipo de avaliação precisa ser feita em todo início de trabalho. Minha atuação será de menos show e mais ação. Valor: Após veto e contingenciamento, o orçamento da pasta autorizado no momento é de R$ 1 bilhão. Em caixa, no entanto, o limite financeiro em 2011 é de R$ 700 milhões, utilizados para financiar também os restos a pagar da gestão anterior, de R$ 450 milhões. Como trabalhar em um ano de vacas magras? Ana: Temos um compromisso fixo em que não dá para mexer: os custos de manutenção, contratos etc. O que sobrou foi muito pouco para investimentos. Temos os recursos da construção das praças de esporte e cultura [dentro do Programa de Aceleração do Crescimento, no valor de R$ 227 milhões], que já vieram carimbados com esse objetivo. Essa verba não será contingenciada, mas também não é uma ação finalística da pasta. E tivemos o problema em relação aos restos a pagar. Existem muitos Pontos de Cultura [iniciativas culturais da sociedade civil que recebem apoio do MinC, via Programa Mais Cultura, para se equipar e potencializar suas ações comunitárias], e estamos pagando. Mas boa parte dos que reclamam estão com processo irregular. Não podemos ir contra a orientação jurídica. Ainda assim, vamos conseguir lançar ações muito interessantes, em parceria com o Ministério da Educação, para promover a presença da cultura nas escolas, por meio do programa Mais Educação. Da mesma forma, a educação estará mais próxima dos Pontos de Cultura. Criamos, inclusive, a Diretoria de Educação e Comunicação. Já temos um aporte previsto para esse convênio que em breve será lançado. Valor: Qual é o valor que deseja alcançar para o orçamento da pasta? Ana: Aquela velha proposta de pelo menos 1% [do orçamento geral da União] para a Cultura seria um número com o qual daria para trabalhar de forma mais organizada. Na PEC [Proposta de Emenda à Constituição] 150, a previsão é de 2%, que seria o ideal. Acho que entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2 bilhões estariam atendendo às necessidades. Mas temos de trabalhar dentro da realidade do governo. Ainda está insuficiente porque a nossa responsabilidade é muito grande. O Iphan, por exemplo, tem grande parte de seu orçamento utilizada para escorar parede para prédio não cair. Isso não é trabalho de recuperação. O Brasil precisa estar preparado para o volume de gente que virá à Copa do Mundo. As pessoas vão assistir aos jogos, mas vão querer conhecer também o resto da cultura brasileira. Porque fora do Brasil a imagem do país está muito ligada ao esporte e à cultura. Alguns museus brasileiros se encontram em situação muito difícil. O Ministério dos Esportes me chamou para coordenar uma das câmaras temáticas de cultura, educação e ação social. Mas ela precisaria de um orçamento compatível. Fala-se muito da infraestrutura de estradas e aeroportos para a Copa, mas temos de pensar também em nossos museus, nas cidades históricas e em como queremos nos apresentar diante desse mundo de atenções que se voltará para nós. Valor: Houve oportunidade de conversar com a presidente Dilma Rousseff sobre a ampliação do orçamento? Ana: Estou conversando e negociando com a Casa Civil e o Planejamento. A presidente Dilma só entra para bater o martelo. Valor: Os gastos da pasta em 2010 foram exagerados? Ana: A orientação e a visão política eram diferentes. Não cabe a mim julgar. A forma de gestão era uma. Eu trabalho de outra forma. Valor: E que outra forma de atuação seria essa? Ana: A preocupação é dar mais ênfase a projetos estruturantes e não a ações que tenham grande impacto de mídia, mas que não deixam muito resíduo. Reconheço o trabalho que foi implantado, principalmente na gestão do Gil, que teve continuidade com o Juca, como a criação do programa Mais Cultura e dos Pontos de Cultura. Mas continuar não é repetir. Não basta fazer convênio e repassar recurso. Qual será o resultado dessas ações? Que legado e sustentabilidade podem ser gerados? É importante sempre incentivar o fomento. No entanto, se for para se tornar um Estado paternalista e assistencialista, eu sou contra. É preciso buscar formas de independência da ajudinha do governo. Temos de buscar leis, como a criação do Vale-Cultura. Estive recentemente com o presidente da Câmara, deputado Marco Maia [PT-RS], para perguntar como está a tramitação. Trata-se de uma urgência para a Cultura. Esperávamos sua aprovação ainda no primeiro semestre, mas não entrou em pauta. Valor: Depois das contribuições da sociedade, qual é a opinião da ministra sobre o texto final da reforma dos direitos autorais, finalmente concluído pelo MinC? Ana: Fizemos algumas adaptações e o projeto está sendo discutido pelo Gipi [Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual] desde julho. Estou apressando e cobrando. Houve grandes avanços, talvez até em função dos desvios que foram constatados com o aparecimento do tal Coitinho, coitado, que não era autor de coisa nenhuma. [Denúncia recente apontou esquema de pagamento de royalties a Milton Coitinho dos Santos por obras que não tinha composto.] A grande contribuição é a criação do Registro Nacional de Obras. Hoje, não temos condições de saber, a não ser nos casos mais famosos, o que está em domínio público e quem são os detentores dos direitos. Esse banco de dados ficará no MinC, disponível a todos, on-line. Valor: Esse registro será obrigatório? Ana: A gente vai exigir de toda obra editada, publicada ou produzida, seja disco, filme, livro etc., que haja um registro. Com isso, não haverá risco de uma obra ser registrada em nome de outra pessoa. E a produção cultural poderá localizar os autores e obter as autorizações necessárias para a utilização que desejar. O autor poderá também informar se a sua obra está liberada para uso gratuito, se assim desejar, ou mesmo restringir os direitos de seus herdeiros. No caso da música, por exemplo, o Ecad não tem interesse em informar: "Olha, essa obra não precisa mais da nossa autorização". Então é obrigação do Estado entrar em cena e dar uma garantia ao usuário que deseja ter acesso. Valor: Algumas declarações iniciais davam a entender que a senhora seria contrária à criação de um órgão regulador do Ecad. Depois das denúncias envolvendo a entidade, no entanto, o MinC parece apoiar a fiscalização. Qual é a posição da pasta hoje? Ana: Não houve mudança. Eu nunca falei a palavra "fiscalizador" e continuo não falando. Porque fizemos um estudo jurídico e concluímos que não temos esse poder. O que a gente pode fazer é uma supervisão exigindo prestações de contas anuais. Se houver denúncia e existirem autores se sentindo prejudicados, pode-se pedir uma auditoria. Podemos levantar todas essas provas e solicitar uma intervenção da Justiça. Nossa supervisão equivale, portanto, a um acompanhamento direto. Não é um órgão fiscalizador como está sendo falado. Pode ser que, futuramente, se pense numa agência. Mas isso não está previsto porque seria muito complicado. Valor: O fato de a senhora ser cantora trouxe dificuldades para a discussão do tema e suscitou as acusações de que seria ligada ao Ecad? Ana: Que fique claro que não sou ligada ao Ecad. Ou melhor, sou ligada ao Ecad tanto quanto Gil, Caetano e todo mundo que mexe com música. Eu sou do mundo da cultura. Isso foi uma tentativa de desvirtuar a minha opinião, procurando dar a conotação de que eu teria compromissos particulares. Valor: Assunto prioritário na gestão anterior, a reforma da Lei Rouanet foi raramente tratada publicamente pelo MinC em 2011. A pasta acaba de questionar diversos pontos do projeto que tramita na Câmara. Qual é a posição, afinal, sobre a criação do Procultura? Ana: Estamos para fechar pontos importantes que foram discutidos internamente. A Frente Parlamentar da Cultura também estranhou que nós tivéssemos questionado alguns aspectos. Conversei com a deputada Alice Portugal [PCdoB-BA, autora de diversas alterações no projeto] e disse a ela que existiam alguns problemas técnicos, o que é normal, já que somos nós que vamos lidar com a lei. Pela relatoria dela, o sistema ficaria aberto para receber propostas 365 dias por ano. Isso é impossível. Além disso, a deputada estabeleceu um sistema de pontuação que permite que todas as áreas culturais atinjam a margem de 100% de renúncia fiscal ao patrocinador. É preciso verificar quais setores necessitam de estímulo maior. E também estimular o uso da lei para fortalecer o Fundo Nacional de Cultura, que organiza a distribuição de recursos por Estados e municípios com parâmetros democráticos. Estamos discutindo para apresentar tudo isso ao deputado Pedro Eugênio [PT-PE, atual relator do projeto]. Ele analisará as nossas propostas e as outras que está recebendo. Estamos em fase de diálogo. Valor: A senhora então defende o fim dos 100% de renúncia? Ana: Eu vejo a necessidade dos 100% em alguns casos, como patrimônio. É preciso haver estímulo para esse tipo de patrocínio. Mas o empresariado precisa compreender também a importância de entrar com o chamado dinheiro bom, que não é da lei de incentivo, investindo em ações de menor visibilidade. Valor: Nesse acalorado cenário de críticas e manifestações de apoio, a senhora acredita que permanecerá no posto até o fim do governo Dilma? Ana: Eu fui convidada para ficar durante os quatro anos. Não vou lançar projetos midiáticos visando ultrapassar uma suposta reforma ministerial que os jornais estão dizendo que vai ocorrer, sem que a presidente tenha sequer confirmado a existência de qualquer reforma ministerial. Eu não posso me pautar por isso. Já vi muitos e-mails dizendo que eu tinha de sair até o dia de São João. Passou São João e nada aconteceu. Estou tranquila. Da parte da presidente, não sinto que existam sinais de desaprovação. Ela sabe muito bem o que quer e tem sido muito clara em seu apoio à Cultura. Evidentemente que, na hora em que a presidente achar que é o caso, ela pode me substituir. E tudo bem, normal. |
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